Entrevista com Marta Volpiani a voz da Dona Florinda

 

Por: Cleber Almeida




Tratando-se de canais de TV aberta, nem sempre nos damos conta da quantidade de produções estrangeiras sendo veiculada diariamente na programação das emissoras, sejam filmes, séries, desenhos etc. Isso por que um percentual considerável do conteúdo está em língua portuguesa. Num geral vemos conteúdo em outras línguas apenas em canais fechados ou nos cinemas.

Um projeto de lei (2584/11) do deputado licenciado João Rodrigues (PSD-SC) determina que 70% dos filmes exibidos na televisão sejam dublados, porém, a lei não foi aprovada pela Câmara e está arquivado, a menos que haja recurso para análise em Plenário.

É muito interessante notarmos que as vozes que ouvimos nas dublagens acabam marcando um determinado personagem, isso porque aquela voz específica ao longo do tempo acaba caracterizando o personagem, dando vida e personalidade a ele em língua portuguesa. Um exemplo, você já viu filmes com o ator Eddie Murphy? Provavelmente sim, e se notou em todos os filmes com ele a voz da dublagem é a mesma. E isso vale para todos os atores, cada um deles terá um dublador oficial para garantir esta personalização do personagem. Dá próxima vez que ver um filmes com o Eddie Murphy ouça bem o timbre da voz e tente identificar com outros filmes dele.

Em algum momento de sua vida você já deve ter se perguntado, “de quem é a voz daquele meu personagem favorito da TV?”. Mas nem sempre temos a resposta não é mesmo? Isso porque os profissionais de dublagem utilizam-se exclusivamente da voz e dificilmente os vemos na TV, a não ser que esteja numa entrevista a respeito do assunto.

Uma das séries mais conhecidas pelos brasileiros, sem dúvida nenhuma é o Chaves exibido no Brasil desde 1984. Acredito que qualquer pessoa seja capaz de reconhecer de olhos fechados a vozes dos personagens deste seriado.

Tive o grande prazer de fazer direção de dublagem pela Na Mosca Produções e em seguida entrevistar a Marta Volpiani que imortalizou as vozes da Dona Florinda e da Póps, ela fala de como começou na carreira, sobre o mercado e boas dicas para quem deseja ingressar na área.

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Marta Volpiani a voz da Dona Florinda e da Póps (Florinda Meza García Gómez)

Leia a entrevista na íntegra abaixo:

Cleber Almeida Quando você percebeu que poderia ser uma profissional da voz?

Marta Volpiani – Eu já era atriz, e fazia novelas na TVS ( hoje SBT ) , ainda  quando era na Vila Guilherme , e lá havia  estúdios de dublagem  onde eram dubladas as novelas mexicanas e alguns seriados . No intervalo entre uma novela e outra, eu ficava desempregada, aliás como é até hoje, e num desses   intervalos , fui fazer um teste de dublagem, fui chamada em seguida para dublar uma novela, e logo depois para dublar o Chaves.

Cleber Almeida – Como foi o inicio de sua carreira?

Marta Volpiani – Sempre soube que queria representar, quando mudamos para São Paulo, eu tinha 13 anos e já procurava fazer parte do grupo de teatro da escola. Ao terminar o Colegial, fui para a EAD fazer Artes Dramáticas, no meio do curso já comecei a ser chamada para fazer pequenos papéis na TV e teatro.

Cleber Almeida – Quais as maiores dificuldades que você enfrentou ao longo de sua carreira?

Marta Volpiani – As dificuldades na carreira artística são muitas, mas eu acho que a instabilidade é a maior delas,  antigamente um numero grande de atores eram contratados da emissora, hoje  os contratos são pelo tempo de duração do personagem, e isso gera uma insegurança muito grande, poucos são os atores que emendam um trabalho no outro, ou que tem o privilégio de ser funcionário da emissora.

Cleber Almeida – Como surgiu a oportunidade de dublar a Dona Florinda?

Marta Volpiani – Eu estava dublando uma novela mexicana, quando o Marcelo Gastaldi,  entrou no estúdio e falou " Gosto de seu trabalho, está pintando uma série, que eu vou dirigir, e tem um papel que eu acho que você vai fazer bem " . Ele era o  dono da série e faria o personagem principal ' Chaves " . E realmente ele me chamou para fazer a vóz da  Dona Florinda . Pena que ele não viveu para assistir ao sucesso da série, pois faleceu  alguns anos depois.

Cleber Almeida – Dublar um personagem tão marcante para a TV brasileira trouxe alguma projeção para sua carreira?

Marta Volpiani – Trouxe  muita projeção, para você ter uma idéia da importância  de ter dublado a Dona Florinda, fiz muitos outros trabalhos na TV e no teatro, que me renderam prêmios e projeção, mas até hoje, o trabalho que mais me abre portas, e que emociona todas as pessoas é a Dona Florinda.

Cleber Almeida – Como é o seu dia a dia, as pessoas reconhecem sua voz como sendo a da personagem (Dona Florinda)?

Marta Volpiani – No meu dia a dia, a toda hora onde quer que eu vá, tem alguém que reconhece a voz, se não reconhece de imediato, fica tentando saber de onde é a voz e quando fica sabendo que é da Dona Florinda é uma festa, tem gente que chora, outros que querem gravar mensagem em celular, tirar fotos, é uma emoção só.

Cleber Almeida – Você também fez a Póps, como foi esse laboratório para criar a personalidade do personagem, visto que a interpretação era feita pela mesma atriz?

Marta Volpiani – Na verdade não houve laboratório para criar a Pópis,  fomos para o estúdio , eu me deparei com a Florinda fazendo aquela menina meio atrapalhada, e eu não queria que as vozes ficassem parecidas, e como nunca fui boa em fazer voz de criança , fiquei pensando como poderia fazer  aquele personagem com um diferencial, para que não lembrasse a voz da Dona Florinda. O Diretor de dublagem na época era o Osmiro Campos, dublador do Professor Girafales, e começamos a pensar  em como fazer. Foi então que fiz uma brincadeira, fazendo a personagem fanha. O Osmiro gostou e disse " Acho que achamos a personagem " E a Pópis acabou ficando fanha.

Cleber Almeida – Após tanto tempo, como é ouvir sua voz neste personagem até hoje na TV?

Marta Volpiani – É normal, mesmo porque ao longo desses anos todos, nunca parei de ouvir a minha voz na TV. O bom é saber que minha voz não mudou tanto, isso porque tenho os parâmetros todos os dias.

Cleber Almeida – Você fez dublagens para outros trabalhos? Quais?

Marta Volpiani – Muitos outros trabalhos, como filmes para TV, cinema, desenhos animados, documentários, institucionais etc. Neste momento terminei de dublar um filme para a Disney, chamado Malévola, que deve entrar nos cinemas por esses dias. Faço a narração do filme, o personagem chama-se Aurora. Mas o que mais marcou mesmo foi o Chaves.

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Cleber Almeida – Como está o mercado de dublagem hoje?

Marta Volpiani – Muito complicado, os grandes estúdios fecharam como a Alamo e Herbert Richers, os trabalhos ficaram pulverizados em vários estúdios, muitos dos quais de fundo de quintal. As escolinhas de dublagem contribuíram para despejar no mercado muita gente que não é ator, e que não tem a menor condição de dublar. Por outro lado, os clientes que não querem pagar o valor de mercado para dublar um filme acaba optando por estúdios menores e que  por utilizar mão de obra mais barata, colocam no mercado trabalhos sofríveis . Claro que existem alguns bons estúdios, mas São Paulo que já foi um mercado de trabalho maravilhoso está muito prejudicado.

Cleber Almeida – Existe uma dúvida, por parte de quem tem interesse em ingressar na área, relativa à remuneração do dublador. Como é feita?

Marta Volpiani – O trabalho é pago por hora de dublagem e é padronizado. Protagonista recebe hoje R$ 92,28 a hora , e coadjuvante R$ 89,35. É muito pouco. Deveria haver um cachê como é em todas as outras áreas artísticas. Mas infelizmente é assim, um trabalho mal remunerado. É claro que pessoas que dublam 8 ou mais horas por dia, acabam tendo uma boa remuneração. Mas normalmente não é assim que acontece. O mercado de locução, como você sabe é outra estória e a remuneração é diferente.

Cleber Almeida – Que dica você deixaria para quem pretende ingressar neste segmento de dublagem?

Marta Volpiani – Primeiramente a pessoa tem que ser ator, senão jamais vai fazer um bom trabalho. A dublagem não é só sincronizar direito, mas também é interpretar aquele personagem. Muitas vezes uma boa dublagem melhora muito o papel do ator, e o contrário também é verdadeiro. Já vi bons filmes serem destruídos por uma dublagem ruim. Acho que a pessoa que quer ser dublador, antes de cursar uma escolinha de dublagem, tem que cursar uma escola para atores, e se preparar. Não existe ator e dublador, todos são atores atuando em áreas diferentes.

 

 

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